A maioria dos filtros solares comerciais citados na recente publicação de Downs CA, et al.1 contém ingredientes utilizados há mais de 10 anos em todo o mundo. São aprovados no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que é extremamente exigente em relação aos testes de segurança (toxicológico, sensibilização, absorção, irritação e mutagenicidade) e possui uma rígida legislação, uma das melhores do mundo, quanto às substâncias permitidas e suas concentrações máximas nos filtros solares.2
Os benefícios do uso regular dos filtros solares são comprovados, de forma cientificamente robusta, na redução dos efeitos deletérios da radiação solar sobre a pele. Os filtros solares são imprescindíveis no esquema terapêutico de inúmeras doenças desencadeadas e/ou agravadas pelo sol (lúpus eritematoso, por exemplo, que inclui formas graves), assim como na prevenção do câncer de pele, incluindo o melanoma, em pessoas predispostas (peles claras, olhos claros, histórico pessoal e/ou familiar).
A pele é permeável a uma série de substâncias na dependência de vários fatores relacionados à formulação e à própria pele. Uma vez atingida a derme, assim como por via inalatória, muitas substâncias químicas chegam à corrente sanguínea. Vivemos num mundo repleto de produtos químicos que entram em contato o tempo todo com os seres humanos. Assim, estar presente na corrente sanguínea, pode não representar nada e o organismo humano dispõe de mecanismos para metabolizar e eliminar essas substâncias.
A via transdérmica é utilizada para administração de medicamentos como vacinas, insulina, hormônios, analgésicos, anti-inflamatórios, anticoncepcionais, medicamentos psiquiátricos e para a doença de Alzheimer.
Em 2019, um grupo de pesquisadores da agência regulatória para drogas e alimentos americana (FDA) investigou a absorção de componentes de filtros solares, incluindo o octocrileno, aplicados em grande quantidade, em 75% da superfície corpórea, 4x/dia, por quatro dias.
Foram identificados os componentes na corrente sanguínea, sem nenhuma repercussão clínica imediata. Os autores salientaram que as concentrações encontradas no sangue não significavam risco de câncer em órgãos internos, efeitos hormonais, assim como para gestação e lactação. Não foram avaliados efeitos a longo prazo. Vale lembrar que esse esquema de aplicação não é o que acontece na vida real; dermatologistas recomendam o uso diário, contínuo, 2x/dia, mas em áreas limitadas da pele, ou seja, não cobertas pela roupa, somente ao se expor ao sol.
O estudo de Downs CA, et al1 foi feito in vitro, ou seja, de forma experimental, com uma superdosagem do octocrileno, que não corresponde à concentração dos produtos comerciais citados pois, não seriam aprovados, em nenhum país do mundo, para uso em humanos. Apesar dos autores serem reconhecidos nos meios científicos em relação ao assunto e o estudo apresentar boa qualidade metodológica, não é possível extrapolar suas conclusões para seres humanos. Seriam necessários estudos in vivo, envolvendo seres humanos, utilizando a concentração de octocrileno acima de 10%. Tais estudos dificilmente seriam aprovados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e pela Anvisa.
Não há dúvidas de que há muito para ser estudado sobre filtros solares e fotoproteção, como em todas as áreas da Medicina. Em artigo recente de Jinah Yoo,3 são destacados aspectos relevantes sobre a história dos filtros solares e da fotoproteção. Há relatos da busca de proteção contra a radiação solar desde 4.000 AC, pois já existia a hipótese dos danos à pele causados pelo sol. Entretanto, desde o século passado, acumularam-se conhecimentos baseados em evidências.
O primeiro filtro solar anti-UVB foi produzido em 1928 e sua eficácia e segurança comprovada em 1956. Filtros anti-UVA surgiram em 1980 e medidas regulatórias foram desenvolvidas a partir de 1970. Acredita-se que o mercado dos filtros solares atinja cifras de US$24,4 bilhões, em 2029, demonstrando a preocupação sobre os efeitos deletérios da luz solar na pele, particularmente a elevada prevalência do câncer de pele que representa problema de saúde pública, com altos custos para o sistema público de saúde para o seu correto tratamento. Novos ingredientes são continuamente produzidos, com proposta de maior eficácia e segurança.
A Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) acompanha atentamente os resultados de estudos sobre o assunto e, até o momento, mantém as recomendações para uso dos filtros solares aprovados e registrados na Anvisa, de acordo com o Consenso de 20144
e a legislação brasileira sobre fotoproteção.